Não sentir, sentir demais em ‘Ensaio para o vazio’

Na noite de segunda feira, no teatro da Alfaiataria Espaço de Arte, na Cidade de Curitiba, pude me deparar com dores e remorsos de momentos passados.

Em Ensaio para o Vazio, três atrizes iniciam sua performance com partes dos poemas de grandes – e tristes – mulheres, sendo elas Alejandra Pizarnik, Alfonsina Storni, Anne Sexton, Lizzie Siddal, Florbela Espanca, Sarah Kane, Sylvia Plath e Virginia Woolf. O cenário conta com projeções de alguns vídeos, e quando vi o nome de Florbela, soube instantaneamente que realmente seria espancada – com o perdão do trocadilho.

O texto nos faz pensar e sentir, doer. Se não estiver REALMENTE disposto a refletir e talvez reabrir algumas feridas, não assista esta peça. No entanto, a reflexão que ela traz sobre a dor de mulheres e todas as experiências que já precisaram passar na vida, é absolutamente necessária.

Você já se perguntou sobre qual a idade em que as pessoas se tornam conscientes sobre transtornos? Depressão e ansiedade, mais especificamente. Ou então, sobre quando é socialmente aceitável ter um transtorno? Em um dos relatos das atrizes, isso é trazido à tona. Uma criança que sofreu abuso aos 5 anos, aos 9 anos, pode ter depressão, aos olhos de um adulto? Ou é algo que só pode acontecer na vida adulta, já que problemas de crianças são “pequenos e bobos”?

E a baixa autoestima, desde criança? Não gostar de usar um biquíni porque os familiares fazem piadas sobre seu corpo, e crescer com esse complexo. Na vida adulta, começar a superar ao iniciar a vida sexual, no entanto, ser tratada como alguém sem pudor, por aprender a admirar seu próprio corpo e gostar dele. Mulheres sofrem pequenas violências o tempo todo, em todos os lugares.

As atrizes despiram suas almas falando sobre relatos pessoais e os sentiram novamente, tendo momentos de choro no palco, e suas expressões mostraram o quanto era necessário finalmente falar aquilo que as torturava por dentro.

Analisando a estética da peça, foi algo intimista e delicado, as atrizes estavam expostas de corpo e alma, falando sobre seus traumas, suas dores e suas vivências, além de usarem apenas lingerie em diversos momentos.

O cenário era simples, uma arara com roupas ao lado esquerdo do palco e objetos cênicos espalhados dos dois lados. Conta também com um pequeno número de dança muito bonito, e a cena final é incrivelmente dolorosa, onde uma das atrizes despeja sobre o corpo uma garrafa de vinho, e juntamente com o texto e a trilha sonora, assemelha-se a sangue sendo derramado.

A direção de Sergio Marcio Palacios foi certeira e delicada, pecando apenas na projeção das imagens nas paredes do teatro, onde a visibilidade foi parcialmente prejudicada pela posição da tela.

A peça não é leve, mas com certeza foi uma experiência valiosa. Senti, refleti e com certeza não fui a única.

DESCRIÇÃO

texto fala sobre a depressão e o vazio, mas, também da esperança.

*Em espanhol, com projeção de legendas em português.

FICHA TÉCNICA

Companhia: Aldea Cultural / Laboratorio 21 | Direção: Sergio Marcio Palacios | Elenco: Bella Rojas, Alejandra Góngora, Salem Troncoso

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