A adolescência é uma fase de intensas transformações emocionais e comportamentais, que se tornam ainda mais complexas na era digital. Filmes e séries têm abordado a saúde mental de adolescentes de forma sensível, ajudando a iluminar os desafios enfrentados por essa geração.
Representações da Saúde Mental na mídia
Diversas produções cinematográficas e televisivas oferecem insights valiosos sobre a saúde mental na adolescência:
- “As Vantagens de Ser Invisível” (2012): Acompanha Charlie, um adolescente introvertido que lida com depressão e ansiedade, encontrando apoio em amizades que o ajudam a superar traumas.
- “Por Lugares Incríveis” (2020): Baseado no livro de Jennifer Niven, o filme explora luto, depressão e ideação suicida através da história de Violet e Theodore, que encontram conforto um no outro.
- “O Mínimo Para Viver” (2017): Aborda a luta de Ellen contra a anorexia nervosa e sua jornada em um grupo de apoio.
- “Divertida Mente” (2015) e “Divertida Mente 2” (2024): Essas animações da Pixar oferecem uma visão acessível sobre as emoções e a saúde mental, com o primeiro focando em emoções básicas e o segundo introduzindo a ansiedade e outras emoções complexas na adolescência.
- “Precisamos Falar Sobre o Kevin” (2011): Um drama intenso que levanta questões sobre saúde mental e comportamento na relação entre mãe e filho adolescente.
- “Meninas Malvadas” (2004) e “A Mentira” (2010): Apesar de comédias adolescentes, esses filmes tocam em temas como insegurança, bullying, pressão social e seus impactos na saúde mental e relacionamentos.
- “Meu Casulo de Drywall” (2024): Filme brasileiro que explora a saúde mental de pais e filhos, conectando-se ao bem-estar emocional de adolescentes no ambiente familiar.
- “Red: Crescer é uma Fera” (2022): Animação da Pixar que aborda as mudanças da puberdade e as emoções intensas de forma metafórica.
- Séries como “Heartstopper”, “Anne with an E” e “Atypical”: Representam de forma sensível questões como identidade, ansiedade e relacionamentos, relevantes para a discussão sobre saúde mental.
- “Close” (2022): Drama que aborda amizade, masculinidade e as consequências emocionais de eventos inesperados.
- “O Mundo Depois de Nós” (2023): Pode gerar discussões sobre ansiedade e o impacto da tecnologia.
- “Barbie” (2023): Aborda questões de identidade e expectativas que podem afetar a saúde mental.
A Série “Adolescência” (2025): Um olhar profundo
A minissérie da Netflix, “Adolescência” (março de 2025), é um exemplo contundente de como a saúde mental dos adolescentes pode ser o tema central de uma produção. A trama de Jamie Miller, um garoto de 13 anos acusado de assassinato, serve como um mergulho nas consequências do bullying escolar e da influência de subculturas online extremistas (como a incel) nas redes sociais.
A série expõe os perigos desses ambientes, gerando discussões cruciais sobre a deterioração da saúde mental na era digital, o impacto das redes sociais, a influência de discursos de ódio e misoginia, e a importância da atenção de pais e educadores aos sinais de sofrimento dos jovens.
Os sinais de alerta e o papel da família
Em entrevista ao Folhetim, a psicóloga Gabriely Guimarães ressalta que a fase da adolescência, com o emocional em formação, torna os jovens mais vulneráveis aos efeitos das redes sociais. Os principais sinais de alerta que pais e educadores devem observar incluem:
- Mudanças de humor e comportamento;
- Isolamento;
- Queda no desempenho escolar;
- Comentários de desesperança ou inutilidade.
Manter um diálogo aberto e frequente com os adolescentes é crucial. É fundamental orientá-los sobre o uso consciente das redes sociais, estabelecendo limites saudáveis para um consumo ponderado. A liberdade para que o adolescente exponha o que está consumindo online fortalece o acompanhamento parental.
Gabriely enfatiza a importância de desenvolver a autorregulação emocional para lidar com frustrações e impulsos, especialmente aqueles vindos de influências digitais. Para isso, é essencial que o jovem tenha um espaço de acolhimento, como a psicoterapia, e participe de atividades sociais fora de casa, estimulando o desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais. O incentivo a esse desenvolvimento deve começar desde a infância, dentro do ambiente familiar.
Diante da exposição a conteúdos potencialmente prejudiciais na internet (violência, misoginia, discursos de ódio), a psicologia desempenha um papel fundamental no desenvolvimento do senso crítico e das habilidades de discernimento dos adolescentes.
A psicologia auxilia na construção da identidade e da autoestima, frequentemente abaladas por comparações online. Além disso, orienta pais e educadores sobre a supervisão do consumo de conteúdo digital. Mesmo que os adultos não dominem todas as plataformas, o diálogo continua sendo o melhor caminho para entender o que está sendo acessado e com quem o adolescente interage, prevenindo riscos que eles, por falta de maturidade, podem não perceber.
Validação online e autoestima: Um desafio contemporâneo
A busca por validação online afeta profundamente a autoestima dos jovens. Gabriely ainda explica que a necessidade de pertencimento é natural, mas o problema surge quando o valor próprio fica refém da aprovação alheia. Os principais efeitos dessa busca são:
- Baixa autoestima;
- Necessidade constante de exposição;
- Ansiedade;
- Sensações de inadequação.
Para promover um senso de valor próprio intrínseco, menos dependente da aprovação externa, é vital:
- Reforçar as características pessoais do adolescente, não focando apenas no externo.
- Estimular a psicoterapia para um maior autoconhecimento e cuidado.
- Promover a educação emocional em casa e nas escolas, incentivando o diálogo e a conscientização sobre os riscos das redes sociais.
- Oferecer suporte emocional por meio de escuta ativa, sem julgamentos, e comunicação não violenta.
- Estabelecer rotinas e espaços de convivência sem telas, como delimitar horários e locais para o uso de dispositivos.
Estratégias pedagógicas e o papel da escola
A pedagoga, Pamella Kelly Toski, destaca a importância de estratégias pedagógicas nas escolas para promover o bem-estar emocional e a segurança online dos estudantes, indo além de campanhas pontuais. As escolas podem:
- Integrar a educação digital ao currículo pedagógico: Abordar a história e evolução da comunicação, e seu impacto social, em disciplinas como história.
- Criar um ambiente de apoio e diálogo: Escutar os jovens, atuando como guias em vez de fiscais, e procurar entender seu universo digital em vez de proibir o acesso.
- Acompanhar e estabelecer limites claros e colaborativos: Ter uma via de mão dupla onde a escuta e a compreensão mútua guiam as orientações sobre o que é adequado ou não.
- Promover palestras com especialistas em cyberbullying: Preparar os alunos para lidar com a negatividade e o assédio online, e ensinar a não se comparar com os outros, valorizando suas próprias qualidades e conquistas.
Pamella alerta para os riscos da comparação social no ambiente virtual, que pode gerar ansiedade e depressão. É crucial preparar os adolescentes para lidar com o excesso de informações, muitas vezes distorcidas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reforça que a proteção do adolescente é uma responsabilidade compartilhada entre pais, escola e o ambiente social. As escolas, mesmo sem assistente social ou psicólogo, podem buscar convênios e parcerias com instituições de ensino, clínicas e órgãos públicos para oferecer atendimento e orientação.
Os desafios do mundo real vs. Virtual e o suporte familiar
A assistente social, Fernanda Milane aponta que a pressão por desempenho na vida pessoal, acadêmica e profissional é um grande desafio emocional para os adolescentes. Muitos jovens, imersos no mundo virtual, enfrentam dificuldades para se conectar com a realidade, onde é preciso lidar com frustrações, esperar e desenvolver habilidades sociais.
A proibição do celular nas escolas, por exemplo, gera inquietação, pois muitos adolescentes o utilizam quase que exclusivamente para redes sociais, tendo dificuldade em outras funcionalidades. Essa proibição, muitas vezes, não encontra apoio dos pais, o que fragiliza a parceria entre família e escola.
Fernanda ressalta a importância de a escola ensinar conceitos e regras que serão aplicados no ambiente de trabalho, contrastando com a mentalidade de “influencer” que muitos jovens almejam, onde acreditam que ganharão mais sem a necessidade de horários e regras.
O suporte emocional e material da família é fundamental. Uma família que oferece suporte emocional tende a ter um adolescente mais centrado, capaz de entender seu contexto e buscar apoio em casa para lidar com problemas. Esse diálogo, baseado na escuta e sem recriminações, é crucial para a formação de valores, construção da identidade e autonomia do jovem.
Isolamento, comportamentos de risco e a busca por aceitação
O isolamento no quarto com o celular é um comportamento comum, mas os pais, muitas vezes, não percebem os riscos. O estresse do dia a dia e a falta de tempo dificultam o acompanhamento adequado, e a própria saúde emocional dos adultos também pode estar abalada.
A busca por aceitação de grupos leva adolescentes a mudar sua vestimenta, modo de falar e ser. Essa necessidade de pertencimento pode, por vezes, levá-los a comportamentos de risco (uso de álcool, drogas) para se incluírem.
O serviço social, nesse contexto, trabalha com o reconhecimento da diversidade, oferecendo autonomia ao adolescente para que ele se reconheça como ser único, com desejos e vontades, mas também com direitos e deveres. O assistente social acolhe o adolescente com escuta ativa, entendendo suas necessidades e encaminhando-o para a rede de apoio necessária (saúde, trabalho, social). O objetivo é que o adolescente entenda seu lugar no mundo e se sinta acolhido por profissionais e pela família.
A necessidade de atualização contínua dos pais
Pamella, como mãe de adolescente, reforça que os pais precisam estar em constante atualização sobre o universo digital de seus filhos. É fundamental que os adolescentes apresentem argumentos plausíveis para suas vontades (como ter uma rede social), e que os pais busquem conhecimento, mesmo fora de suas áreas profissionais, para orientá-los. Ela destaca a importância de trabalhar a ansiedade dos filhos, ensinando-os a esperar por respostas e a pesquisar informações.
Ao preparar os adolescentes para os desafios da saúde mental na era digital, é crucial uma abordagem multifacetada que envolva famílias, escolas e profissionais de saúde mental, priorizando o diálogo, a escuta e o desenvolvimento de habilidades socioemocionais.