Interestelar – 10 anos depois: Obra prima da ficção-científica ou superestimado?

(Atenção: O texto a seguir contém spoilers de Interestelar. É recomendado ter assistido ao filme antes de ler o texto.)

Acredite se quiser mas eu nunca tinha assistido Interestelar. Algo que pode soar como heresia para os cinéfilos mais ávidos, ainda mais pelo fato de Christopher Nolan ser um dos meus diretores favoritos, mas ao longo de 10 anos eu nunca vi o longa que muitos consideram seu melhor trabalho. Eu tinha 11 anos quando o filme foi lançado originalmente em 2014. Por se tratar de uma obra muito complexa, este foi um filme que perdi de ver nos cinemas e  que deixei na minha lista pessoal de “Assistir mais tarde” durante anos.

Quando finalmente decidi que veria Interestelar em 2024, notícias de seu relançamento em comemoração aos 10 anos do longa começaram a circular e optei por “meu guardar” e ter a experiência completa numa sala de cinema. Ao longo destes 10 anos, no entanto, já ouvi as mais diversas opiniões sobre Interestelar, desde chamá-lo de “obra prima” até “filme pretensioso e superestimado”. Bom, onde me encontro em meio a este espectro? Para descobrir, eu lhe convido, caro leitor e leitora, a me acompanharem nesta retrospectiva de Interestelar e a perspectiva de uma pessoa assistindo pela primeira vez 10 anos depois.

Caso você tenha caído de paraquedas neste texto e não saiba nada sobre Interestelar ou faz muito tempo desde que assistiu pela última vez, esta é a premissa básica do filme: Interestelar é ambientado em um futuro próximo onde o planeta Terra se encontra com escassez de recursos. Nosso protagonista é Cooper, (Matthew McConaughey) um ex-piloto da NASA  que é recrutado para pilotar uma missão onde ele e um grupo de astronautas devem buscar um novo planeta para a humanidade habitar. Entretanto, Cooper se vê dividido entre a missão e o fato de deixar seus filhos para trás.

Foto
Foto: Warner

Interestelar é um filme que em nenhum momento apressa sua trama. O roteiro dá bastante espaço para situar o espectador e desenvolver a realidade da Terra (que chega a ser assustador o quão real e próximo isso está ficando da vida real) e a relação entre os personagens, principalmente o relacionamento de Cooper com sua filha Murph (Mackenzie Foy).

A relação pai e filha é o coração da história, sendo uma dinâmica muito fácil do espectador comprar já que o filme dá tempo para desenvolver a relação e pela excelente performance de McConaughey. Ele e Foy têm bastante química em tela e suas interações rendem algumas das passagens mais emocionantes do filme inteiro. Aproveitando o tópico, o roteiro consegue desenvolver muito bem outros personagens como a Dra. Brand (Anne Hathaway) e o robô TARS (Bill Irwin), estabelecendo suas personalidades, motivações e rendendo dinâmicas bem divertidas e interessantes entre os personagens durante a viagem espacial.

Por falar em viagem espacial, é nessa hora que agradeço ao fato de que pude ter a experiência cinematográfica completa, já que as sequências espaciais de Interestelar são simplesmente deslumbrantes de ver em tela. Desde a iluminação, uso de cores e enquadramento, a fotografia do filme consegue transmitir muito bem a imensidão do cosmos e como somos pequenos perante o universo. Seja uma nave orbitando Saturno, as paisagens dos planetas Miller e Mann ou o buraco negro Gargantua, Interestelar é lotado de enquadramentos de tirar o fôlego, fazendo você pensar “Este será meu novo fundo de tela” enquanto assiste.

Foto: Warner

A equipe de design de produção e efeitos especiais também merecem elogios. O uso em conjuntos de efeitos práticos e digitais rendem cenas muito bonitas e empolgantes de assistir, ainda mais no cinema. E eu não poderia falar de Interestelar sem mencionar sua memorável trilha sonora.

Hans Zimmer é um compositor que já trabalhou diversas vezes com Nolan, seja na trilogia Cavaleiro das Trevas e A Origem, mas o trabalho em Interestelar pode muito bem ser o melhor de sua carreira. Com bastante uso do órgão, Zimmer cria faixas que conseguem ser melancólicas, contemplativas e empolgantes tudo ao mesmo tempo. Chega a ser impressionante o quanto você se empolga com cenas tão simples como uma caminhonete atravessando um milharal ou uma nave acoplando em uma estação espacial, por causa da trilha sonora.

Ao longo destes 10 anos, fui exposto às mais diferentes opiniões e críticas sobre o filme, especialmente da fatídica cena de explicação do buraco de minhoca. Sim, muitos criticam este momento argumentando que Nolan está “dando uma de palestrinha” com o público ou por achar absurdo um cientista explicar para um astronauta um conceito que, em tese, ele já conhece. Quando vi essa cena de fato, pensei comigo mesmo “Cara, como a galera exagerou nisso, hein?”.

Foto: Warner

Buracos de minhoca não são dos conceitos físicos mais fáceis de explicar para o público geral (que não tem obrigação nenhuma de conhecer do assunto), então acredito que essa foi uma solução de roteiro bastante ágil e eficiente, ainda mais que os buracos de minhoca exercem um papel importante na trama. Também é possível achar uma justificativa narrativa para essa cena, já que diversas vezes é mostrado como o conhecimento científico acabou sendo perdido (ou ignorado) pela humanidade nos últimos anos.

Outra parte do roteiro que é bastante criticada são as passagens em que o longa aborda o amor como a única coisa que transcende o espaço-tempo. É meio brega e piegas? Até é um pouco. No entanto, como citei anteriormente, a relação de Cooper e Murph é tão bem construída que esse é o tipo de coisa que passa batido. É pela mesma razão que cenas como Cooper vendo mensagens de seus filhos dos últimos 23 anos ou ele tentando se comunicar com Murph pela quinta dimensão são de apertar o coração, porque nós enquanto público compramos a ligação pai e filhos e nos conectamos com os personagens.

Se eu acho que os elogios que Interestelar vem recebendo desde o seu lançamento são verídicos? Pode apostar que sim! Este é um filme que fui assistir com imensas expectativas e ele não decepcionou nem um pouco. Me recordo que quando terminou a sessão, eu passei pelo menos  10 minutos em silêncio, tentando processar e refletir sobre a jornada que tinha acabado de testemunhar. Com ótimas atuações e personagens, ótimo roteiro, direção e produção impecáveis e uma trilha sonora magnífica, Christopher Nolan nos entregou uma experiência cinematográfica inesquecível.

E tal qual como um bom vinho, afirmo com tranquilidade que Interestelar envelheceu muito bem e continua um filmaço, mesmo 10 anos depois.

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