Foto: Foto: Annelize Tozetto
Estreou neste dia 26 de março, na Mostra Lúcia Camargo do 33° Festival de Curitiba, a peça Daqui Ninguém Sai do TCP (Teatro de Comédia do Paraná) dirigida por Nena Inoue, com dramaturgia de Henrique Fontes. Com o elenco da peça selecionado por um edital público em janeiro deste ano, a obra prometia levar ao palco uma homenagem ao autor curitibano Dalton Trevisan.
Antes mesmo de chegar ao público, o espetáculo ganhou a imagem de um processo bastante intenso e turbulento, com um texto de aproximadamente 27 versões. Uma informação curiosa que, pode-se dizer, repercutiu em cena. Com grandes talentos no palco, que sustentaram a atenção da plateia por aproximadamente duas horas, a dramaturgia parecia feita de recortes que não se conectavam entre si e não traziam profundidade aos temas.
Entre esboços de comédia, musical, drama, e apelo sensual, as cenas pareceram esquecer a “curitibanice” tão presente e importante nas obras de Dalton e trouxeram um misto entre momentos rasos e outros tão intensos que no contexto pareceram exagerados: especialmente nas cenas de sexo e nudez. É claro que poderia-se, sim, esperar tais abordagens em contos Daltonianos, mas na narrativa que se construiu (ou não se construiu), uma cena extremamente longa de relação sexual e uma atriz deixando seus peitos a mostra me soou completamente forçado e sem propósito (mesmo que em encenações muito bem feitas).
O mesmo posso dizer da entrada da peça, que aconteceu pela garagem do teatro Guairinha, prometendo uma surpresa por fugir do convencional. A promessa se refletiu em uma experiência rasa e desnecessária da plateia entrando pelo palco, sendo que a acessibilidade também deixou a desejar.
Confesso que nisso tudo me questiono se me senti tocada de alguma forma pelo que assisti, e sinceramente preciso dizer que não. O interesse no autor que eu esperava encontrar me soou como um incômodo, e não daqueles que dá vontade de entender internamente e discutir a respeito. Saí do Teatro me questionando sobre várias incertezas que já me perturbavam, e que vi realmente refletidas ali: a obra de Dalton Trevisan é um assunto delicado. Os próprios curitibanos muitas vezes não tem muito conhecimento a respeito. Será mesmo que a escolha de um dramaturgo de outro estado para homenagear um grande e complexo nome curitibano foi a melhor opção? Teria isso contribuído também para a confusão do processo?
Deixo isso para a reflexão. E volto a falar sobre o elenco, com presenças que conseguiram contornar grande parte das inconstâncias – embora eu também tenha sentido na atuação uma falta de conexão e uma discrepância em diversos momentos. É nítido que há grandes potências no palco, que representam o processo imersivo de pesquisa e trabalho. Destaque para Carol Mascarenhas e Wenry Bueno que arrancaram diversas risadas da plateia, e Lais Cristina que declarou não ter tido muito contato com Dalton Trevisan anteriormente mas claramente debruçou-se nos esforços de entender o que precisava transmitir. Mas trago a provocação de alguns talentos gigantes que senti não terem tido o espaço que mereciam e precisavam ter. Queria muito ter visto mais de Paula Roque e Trava da Fronteira, e da potência que representam na diversidade.
Por fim, digo que é bom ter o TCP na ativa novamente e que há muito a ser trabalhado para projetos futuros ou mesmo para as próximas apresentações de Daqui Ninguém Sai. Que a curiosidade ou a admiração por Dalton Trevisan continue levando mais pessoas ao teatro e histórias para as cenas, mas que de alguma forma seja possível fortalecer ainda mais a importância do autor para o cenário cultural, e a vasta gama de talentos locais que temos na terra do grande Festival de Curitiba.