Reprodução: Maringas Maciel
A já consagrada Cia Stavis-Damaceno (de A Aforista) retorna a Curitiba para estrear em solo paranaense seu novo espetáculo: Nebulosa de Baco. Desta vez, Rosana Damasceno não está mais sozinha e pós-dramática como antes — agora divide os holofotes com Helena de Jorge Portela, em um texto de Marcos Damaceno que, tentando se encontrar, acaba permanecendo no limbo do sucesso.
Após um grande êxito como A Aforista, é natural que companhias enfrentem a difícil missão de superar suas próprias conquistas e as expectativas do público. Em Nebulosa de Baco, Damaceno tenta repetir a fórmula do sucesso anterior — e é justamente nesse esforço para não deixar a peteca cair que ele se perde.
O texto aborda um tema delicado e importante: o encontro entre uma vítima e seu estuprador. No entanto, a força do debate se esvazia quando a cena é transformada em um ensaio. Como em um mosaico, Marcos utiliza as atrizes para criar a ideia de uma montagem cênica onde o maior desafio é conseguir chorar no palco. Acompanhamos Helena, uma atriz mais jovem, tentando atingir essa emoção sob a direção da veterana Rosana. Sim, é provável que você já tenha visto algo semelhante antes: um espetáculo que utiliza o formato de “ensaio” como desconstrução do teatro tradicional.
A pergunta que fica é: por que abordar um tema tão sensível em um contexto tão banalizado? Qual o propósito dessa dramaturgia?
Embora a proposta de discutir a dificuldade técnica de se emocionar em cena seja interessante — e um tema que realmente aflige muitos artistas —, a história escolhida para essa reflexão não parece pertinente. O espetáculo permanece na superfície: apresenta o estupro e a misoginia apenas como pontos de passagem, sem mergulhar verdadeiramente no debate. Ao final, a narrativa se resolve no instante em que a atriz finalmente consegue chorar de verdade — revelando que, afinal, este era o centro da trama desde o início.
À medida que o texto avança, Marcos parece orquestrar uma guerra cênica para decidir qual atriz (ou qual narrativa) ocupará o problema central do espetáculo, chegando a sugerir que a história poderia ser baseada em fatos reais da atriz-personagem. Difícil compreender os porquês — e talvez melhor nem tentar.
Por outro lado, a iluminação de Beto Bruel é um dos grandes acertos: brincando entre o branco e o amarelo para marcar a transição entre personagem e atriz-personagem, a luz constrói com excelência a mudança de ambientes. A cenografia também acerta ao nos transportar para uma sala de ensaio dentro do próprio palco. O figurino, simples, cumpre bem seu papel.
Quanto às atuações: Rosana, que em A Aforista teve espaço para um desempenho monumental, agora se limita a uma função mais coadjuvante. Sua entrega ainda é clara e poderosa, mas não atinge o mesmo ápice. Já Helena de Jorge Portela brilha como o verdadeiro centro do espetáculo — entrega emoção e presença em cada detalhe.
No fim, Nebulosa de Baco pode soar decepcionante para quem admira a Cia Stavis-Damaceno por A Aforista. Mas é importante lembrar: o teatro, assim como a vida, é feito de altos e baixos. A ideia aqui não é questionar a qualidade técnica e profissional da companhia — que permanece incontestável diante da maioria das produções —, mas refletir sobre a necessidade (ou não) de sempre buscar o estrelato. Às vezes, focar em criar e viver o processo pode ser mais enriquecedor do que tentar acertar a fórmula mágica do sucesso.
Espero que Marcos e sua talentosa trupe reencontrem em breve a profundidade criativa que fez de A Aforista uma verdadeira supernova teatral.