Tempo como Personagem no Cinema

Tema que gera simultaneamente fascínio e medo, o tempo é uma das questões que mais intriga a humanidade. Independentemente do quão diferentes possamos ser uns dos outros, seja pelo lugar de origem, crença religiosa ou posição social, o tempo e sua passagem são uma das poucas máximas intrínsecas a todo ser humano. Se temos uma certeza absoluta na vida, é que ela é finita. Por mais que tentemos lutar contra o fluxo, impedir que os grãos de areia de nossas ampulhetas caiam, nunca poderemos mudar o passado. E, mesmo que tentemos estender nosso prazo de validade, o fim chega para todos. É a finitude do tempo que gera tanta intriga e reflexão, seja no campo filosófico, sociológico, religioso e, é claro, na ficção.

A quantidade de obras ficcionais, mais especificamente no cinema, que abordam a questão do tempo é bastante extensa. Provavelmente, a primeira coisa que vem à sua mente ao se falar sobre o tema é a ideia de viagem no tempo. A popularização da ideia na ficção comumente é creditada ao escritor H. G. Wells, em seu livro A Máquina do Tempo (1895).

Nas telonas, a ideia de viagem no tempo começou a se popularizar na década de 60, com a adaptação da obra de Wells e com longas como Planeta dos Macacos (1968), que trouxe como grande reviravolta na trama o fato de que o planeta dominado por primatas superinteligentes é, na verdade, o futuro da Terra. Por mais que muitos filmes compartilhem a temática de viagem no tempo, a forma como eles abordam o tema os diferencia bastante. Nesta matéria, vamos explorar como diferentes filmes exploram e brincam com o conceito de tempo.

Um tipo bastante interessante são os filmes que trabalham o chamado “looping temporal”, onde um personagem fica preso em uma repetição eterna de um mesmo dia ou ciclo. Feitiço do Tempo (1993), No Limite do Amanhã (2014) e a franquia A Morte Te Dá Parabéns (2017-2019) são alguns exemplos de produções que lidam com o tempo dessa forma. Seja na comédia de Bill Murray, onde um repórter é obrigado a cobrir o evento do Dia da Marmota eternamente, um soldado com a habilidade de voltar no tempo ao morrer para continuar lutando em sua guerra, ou uma jovem que deve achar diferentes maneiras de evitar um serial killer, todos esses protagonistas passam por uma jornada com o objetivo de quebrar o ciclo.

Um aspecto que torna esses filmes divertidos de assistir é o elemento da repetição. Assim como os protagonistas, o público também vai se familiarizando (e se cansando) com a repetição de eventos, o que gera sequências bastante criativas dos personagens tentando soluções cada vez mais ousadas para quebrarem o looping temporal.

Obviamente, não dá para falar em viagem no tempo sem mencionar, talvez, os dois maiores e mais populares filmes sobre o tema: as franquias De Volta Para o Futuro e Exterminador do Futuro. Na aventura de Marty McFly e Dr. Brown, o jovem acaba voltando 30 anos no passado e conhecendo seus pais na época da adolescência. Além de ter que achar uma maneira de voltar para seu tempo de origem, Marty também deve assegurar que seus pais se apaixonem, garantindo assim a sua própria existência.

Viagem no tempo é um tema bastante complexo e que pode se tornar extremamente confuso para o espectador, mas os roteiristas de De Volta Para o Futuro conseguem estabelecer recursos bastante simples para ajudar na narrativa. O uso de fotos, jornais e documentos que vão constantemente se apagando e alterando durante a trama é um indicativo muito útil para representar as mudanças causadas na linha do tempo, além de ser um elemento narrativo que gera tensão e urgência tanto para os personagens quanto para o público. Até mesmo em De Volta Para o Futuro 2 (1989), onde as mecânicas da viagem temporal são mais aprofundadas, Dr. Brown consegue explicar para Marty (e para o público, por extensão) conceitos de múltiplas linhas temporais de uma forma bastante eficiente e clara.

Já na franquia de ficção científica de James Cameron, Exterminador do Futuro tem uma visão mais simplificada da viagem no tempo. Enquanto outras obras articulam que cada viagem ao passado cria uma linha do tempo paralela, Exterminador do Futuro trabalha com uma única linha temporal. Curiosamente, o primeiro filme da franquia não está preocupado em alterar o futuro ou impedir a ascensão da Skynet e a guerra das máquinas. Na verdade, Kyle Reese é apenas enviado ao passado para impedir o assassinato de Sarah Connor e, por extensão, de John Connor, por um Exterminador.

Vale lembrar que, se Reese não tivesse voltado no tempo, ele e Sarah jamais teriam se apaixonado, John Connor jamais teria nascido e as máquinas jamais teriam viajado no tempo para matar a mãe do futuro líder da Resistência. A trama de Exterminador do Futuro é um ciclo, algo que os personagens tentam quebrar na sequência, onde, além de impedir que John e Sarah sejam mortos pelo T-1000, eles ativamente lutam para impedir o surgimento da Skynet e o início da guerra. Se o primeiro filme fala sobre preservar os eventos temporais e impedir mudanças, o segundo é seu completo oposto.

O final de Exterminador do Futuro 2, especialmente sua edição do diretor, dá um fim definitivo para a saga, já que mãe, filho e um T-800 aliado conseguem alterar o futuro e salvar a humanidade. Vale dizer que sequências futuras, que não contaram com James Cameron na direção, descontinuaram essa ideia. Hollywood sendo Hollywood, e não deixando uma história acabar.

Outro tipo de viagem no tempo que acontece com certa frequência na ficção é aquele em que a consciência de uma pessoa é projetada para ela mesma em um momento passado. Filmes como Efeito Borboleta (2004), o romance Em Algum Lugar do Passado (1980) e X-Men: Dias de um Futuro Esquecido (2014) são alguns exemplos de produções onde protagonistas enviam suas consciências para si mesmos (ou para outra vida, no caso de Em Algum Lugar do Passado), assim viajando no tempo.

Tal como De Volta Para o Futuro usa o elemento das fotos alterando-se para criar tensão, filmes com viagem no tempo por projeção de consciência tendem a usar como recurso de tensão o fato de o corpo do protagonista estar vulnerável e inconsciente no presente. Caso algo aconteça com seu corpo, a viagem pode ser interrompida ou até mesmo causar-lhe a morte.

Para encerrar o tópico de viagem no tempo, vamos falar sobre Interestelar (2014). O longa espacial de Christopher Nolan é bastante elogiado por sua extensa pesquisa de conceitos físicos, a fim de tornar a experiência o mais cientificamente acurada possível. Interestelar aborda a questão da “Dilatação Temporal”. Basicamente, a Dilatação Temporal se trata de um efeito que pode ser causado pela diferença gravitacional entre dois pontos em localizações diferentes, fazendo com que o tempo passe de forma mais rápida ou devagar em relação ao outro.

Esta é tida como a visão mais crível para a Ciência de uma “viagem no tempo”. Essa ideia fica muito clara no filme quando o astronauta Cooper chega ao planeta Miller, onde 1 hora lá representa o equivalente a 7 anos na Terra. O drama do filme é essencialmente uma corrida contra o tempo: quão rápido Cooper pode cumprir sua missão e voltar para a Terra a fim de não perder a vida de seus filhos?

Também existem aquelas histórias que abordam o tempo de uma forma diferente. Como é a percepção e a passagem do tempo para um ser que jamais envelhece ou que envelhece ao contrário? É exatamente isso que longas como Highlander (1986) e O Curioso Caso de Benjamin Button (2008) abordam. Como uma pessoa com essas condições peculiares vive? Como ela se relaciona com as pessoas ao seu redor? Será que ela consegue encontrar e manter um amor? Todas essas perguntas muito interessantes e intrigantes são exploradas nessas produções, já que o tempo, para esses personagens, é totalmente diferente da nossa percepção.

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