Pega um caldeirão e coloca dentro dele todos os elementos que causam rejeição aos filmes nacionais, como roteiros mal feitos, atuações sofríveis, trilha sonora questionável e, acima de tudo, histórias completamente razas e estapafúrdias.
Agora joga tudo isso fora porque “Vovó Ninja” é um sopro de esperança numa indústria viciada e enviesada, que na maioria das vezes faz mal uso do dinheiro público para entregar produções pobres, algumas delas pseudo-intelectualizadas, que nada acrescentam ao cinema nacional e perdem a chance de fomentar nosso amor pelo que é feito aqui dentro.
Vovó Ninja conta a história de três crianças que vão passar as férias no sítio da avó, onde se metem em várias confusões e descobrem que a avó tem “super poderes”. Uma história batida, é verdade, assim como são TODAS as histórias do cinema (me aponte uma que nunca foi contada). Quando as fórmulas são iguais, o que importa mesmo é o que se faz com elas – e é aqui que o filme se destaca.
Qual é o seu maior tesouro? Ou melhor, você sabe qual é o seu maior tesouro? Este é o tema central de Vovó Ninja.
Somos os herdeiros de uma geração que soube empoderar a mulher mas não conseguiu equilibrar os valores familiares durante o processo. As mulheres conquistaram o direito de seguir seus sonhos enquanto os homens não perceberam que a ausência da mãe pede a presença do pai.
As crianças, hoje, são educadas pelas telas (celulares, tablets, televisão) e pela escola, o que muitas vezes significa educação nenhuma. Não aprendem valores base para viver, como disciplina, curiosidade, convivência, alimentação saudável e prática de exercícios físicos. A raiz desse problema? Pais e mães que trabalham fora e, quando estão em casa, simplesmente não têm energia para cumprir sua parentalidade.
Se no início Glória Pires passa a impressão de ser uma vovó megera, logo percebemos que seu amor faz pelas crianças o que apenas um amor genuíno é capaz de fazer: se dedica a nutrir o corpo e a alma dos netos através de alimentos saudáveis, disciplina e lições de (e para a) vida.
Glória Pires, aliás, mostra porquê continua a ser uma das grandes atrizes do nosso país. Ao representar a mulher independente que conquistou tudo que desejava na vida, mas que ao mesmo tempo descobre seu tesouro não no final e sim no ponto de partida de sua jornada, Glória nos faz sentir o “amor de vó” em cada cena.
O roteiro assinado por Gabi Mancini e Rodrigo Goulart é uma obra prima. Se por um lado é impossível representar qualquer coisa como um todo (a Ideia Pura de Platão), por outro Gabi e Rodrigo conseguiram inserir diversas facetas do que seria o conceito de família moderna, sem deixar nenhuma ponta solta e rechear com humor que diverte sem atacar nada nem ninguém.
Direção de arte, direção de câmera, edição, fotografia, sonoplastia… está tudo impecável – até mesmo, pasmem, as sequências de Kung Fu. Com 25 filmes, 5 séries e duas indicações, não é de se espantar que o diretor Bruno Barreto (1955) tenha conseguido retratar o encontro do velho com o novo de maneira tão assertiva e tão sensível.
Vovó Ninja é o único filme brasileiro que você não pode perder de jeito nenhum em 2024.
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Mais informações: Galeria Distribuidora – Vovó Ninja
One thought on “Sensível e divertido: “Vovó Ninja” é um filme brilhante”
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