Morre Dalton Trevisan, escritor curitibano, aos 99 anos

O escritor curitibano Dalton Trevisan, reconhecido como um dos maiores contistas do Brasil, faleceu na segunda-feira (9), aos 99 anos. Conhecido por sua aversão aos holofotes, o autor de “O Vampiro de Curitiba” manteve uma vida discreta em sua cidade natal, onde produziu cerca de 50 obras, entre contos, novelas e romances, que retratam a capital paranaense e seus personagens.

“Todo vampiro é imortal. Ou, ao menos, seu legado é. Dalton Trevisan faleceu hoje, 9 de dezembro de 2024, aos 99 anos”, anunciou uma publicação na página do autor, fazendo referência ao apelido e ao livro que o consagrou, O Vampiro de Curitiba, publicado em 1965.

Ao longo de sua carreira, Trevisan conquistou os principais prêmios de literatura em língua portuguesa, como o Prêmio Camões, em 2012, e o Jabuti, vencido em quatro edições (1960, 1965, 1995 e 2011). Em 2011, ele também recebeu o Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras pelo conjunto de sua obra. Seus livros foram traduzidos para idiomas como inglês, espanhol e italiano. Recentemente, ele firmou um contrato com a editora Todavia para a publicação de sua obra completa a partir de 2025, ano que marca o centenário de seu nascimento.

Nascido em Curitiba em 14 de junho de 1925, Trevisan formou-se em Direito e chegou a exercer a profissão. Sua estreia literária ocorreu com Sonata ao Luar, obra que ele posteriormente renegaria. O autor alcançou destaque nacional com Novelas Nada Exemplares. Sua escrita, marcada pela concisão, explora o cotidiano, as complexidades psicológicas e os costumes urbanos. Entre 1946 e 1948, ele editou a revista Joaquim, que homenageava “os Joaquins brasileiros” e contou com colaborações de nomes como Mario de Andrade e Carlos Drummond de Andrade.

Capa do livro: O Vampiro de Curitiba (Divulgação)

Desde os anos 1970, Trevisan evitava entrevistas e mantinha uma rotina reclusa em Curitiba, onde poucas pessoas tinham acesso a ele. Em 2021, ele deixou a casa localizada na esquina das ruas Ubaldino do Amaral e Amintas de Barros, no Alto da Glória, que se tornou ponto de interesse literário. A mudança para um apartamento no centro da cidade foi motivada por questões de saúde e segurança.

Segundo um comunicado oficial, Trevisan foi um cronista das angústias cotidianas e das complexidades humanas, retratando com crueza os dilemas morais, a solidão e as contradições da classe média, com atenção especial aos marginalizados. Sua obra trouxe à literatura uma Curitiba que mistura lirismo e escuridão, como em A Polaquinha e Cemitério de Elefantes.

O legado de Dalton Trevisan também alcançou o teatro e o cinema. O diretor João Luiz Fiani, único autorizado a adaptar suas obras para os palcos, lamentou a perda do amigo, destacando seu orgulho em levar textos como O Beijo na Nuca para o teatro. O cinema também deu vida à obra de Trevisan, como na adaptação de A Guerra Conjugal (1969), dirigida por Joaquim Pedro de Andrade em 1975.

A Academia Brasileira de Letras destacou Trevisan como “um dos mais importantes narradores da ficção brasileira contemporânea”, elogiando sua escrita que, embora introspectiva, reflete as transformações sociais. Obras como Novelas Nada Exemplares, A Faca no Coração e Crimes de Paixão ilustram sua habilidade de reinventar o conto.

Por fim, sua relação com Curitiba foi marcada por uma visão crítica e ambígua. Em uma análise recente, a pesquisadora Raquel Illescas, da Universidade Federal do Paraná, definiu sua obra como transgressora e afirmou que, para Trevisan, a cidade era ao mesmo tempo “província, cárcere e lar”.

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