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Uma câmera, um gravador e a coragem de encarar o inferno. Encontro com o ditador (Rendez-vous avec Pol Pot), é um poderoso drama jornalistíco (newspaper movie) que mergulha na tragédia humana do genocídio no Camboja.
O cineasta cambojano Rithy Panh, que possui uma trajetória marcada pela denúncia dos horrores do regime Khmer Vermelho, nos presenteia com mais uma obra-prima. O filme, evita os clichês do cinema político e opta por uma abordagem mais intimista e psicológica de um dos períodos mais sombrios da história.
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Caso o leitor não saiba, em 1975, o Camboja foi tomado pelo regime ditatorial de Pol Pot, líder do Khmer Vermelho, resultando em um dos genocídios mais brutais do século XX. Durante três anos, aproximadamente um quarto da população morreu devido à fome, doenças e execuções em massa. Ao fim do regime, algumas lideranças do partido foram julgadas e condenadas à prisão perpétua, mas Pol Pot nunca chegou perto de uma cela. Ele viveu seus últimos anos em prisão domiciliar e morreu em 1998 sem ser responsabilizado por seus crimes.
A impunidade diante de crimes cometidos por regimes autoritários não é exclusividade do Camboja. No Brasil, embora em uma escala menor, a ditadura militar de 1964 também deixou um legado de tortura, mortes e desaparecimentos inesperados. No entanto, os responsáveis permanecem impunes até hoje. Não somos tão diferentes, brasileiros e cambojanos em encobrir tragédias.
A trama do filme acompanha três jornalistas franceses que se aventuram no Camboja dos anos 70, em meio ao terror instaurado por Pol Pot. O país agora por nome Kampuchea Democrático, se encontra em um regime totalitário há três anos, economicamente devastado, e com quase dois milhões de cambojanos mortos durante um genocídio velado.
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Na busca pelo ‘furo”, os três jornalistas aceitam o convite do regime na esperança de conseguir uma entrevista exclusiva com o ditador. A narrativa segue sob a ótica desses profissionais que possuem perspectivas diferentes sobre o que está acontecendo naquele país.
O trio é composto por um repórter com experiência em Camboja, um fotojornalista e um intelectual simpatizante da ideologia revolucionária. No entanto, à medida que mergulham na realidade do país, descobrem um cenário muito diferente da propaganda oficial. Suas convicções são postas à prova e, pouco a pouco, tudo em que acreditaram é gradualmente destruído.
Rithy Panh, como de costume, demonstra um domínio magistral da linguagem cinematográfica, conferindo ao filme uma estética documental. Para isso, recorre a recursos como arquivos históricos e a sobreposição de imagens de estatuetas nas cenas mais impactantes, especialmente aquelas que envolvem violência. Essa abordagem é uma marca registrada do cineasta, que já afirmou em entrevista ao Cinema Express não se sentir capaz de retratar a violência de forma crua, mesmo após anos de experiência no cinema. Para Panh, os recursos técnicos são suficientes para transmitir a mensagem sem a necessidade de recriação explícita. Assim, quem espera imagens chocantes de violência pode se sentir frustrado com essas escolhas estilísticas, que algumas podem ser interpretadas como “distrações”, mas que, na verdade, são parte essencial da visão artística do diretor.
A fotografia escura e opressiva do longa intensifica a atmosfera de tensão e medo, ampliando ainda mais o impacto visual da obra. Essa estética, aliada à desenvoltura dos personagens, cria um ritmo frenético que nos mantém presos à tela do início ao fim. A trilha sonora marcante do compositor francês Mark Marder complementa magistralmente essa experiência, evidenciando as angústias vividas pelos personagens e a densidade do cenário caótico da trama.
E por falar em personagens, é a atuação dos protagonistas que realmente se destaca. Os jornalistas, interpretados pelos talentosos atores franceses, Irène Jacob, Cyril Gueï e Grégoire Colin, entregam atuações intensas e carregadas de emoção. A química entre eles e a evolução de seus personagens ao longo do filme tornam a narrativa ainda mais envolvente e impactante.
Por fim, Encontro com o Ditador é um filme que nos confronta com a nossa própria humanidade. Ao nos mostrar os horrores do genocídio cambojano, o filme nos força a refletir sobre o poder da mídia, a responsabilidade dos jornalistas e a importância de nunca esquecer o passado.
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