Os anos 2010 trouxeram diversos temas de discussão para nossa sociedade: redes sociais, crises climáticas, saúde mental e tantos outros, mas o tópico de diversidade e inclusão foi, e continua sendo, um dos mais proeminentes. Cada vez mais se discute e cresce a ideia em nosso imaginário popular de que grupos sociais que historicamente não tem tanta representação, como mulheres, pessoas negras, asiáticas, latinas e LGBTQIA+ também podem e devem ocupar espaços de poder no governo e cargos de liderança no mercado de trabalho, posições essas que eram e continuam sendo majoritariamente ocupada por homens, brancos e heteros.
Isso é algo que vale também para o mundo cinematográfico. Cada vez mais temos pessoas dessas comunidades, seja no cenário independente ou nos grandes estúdios, conquistando seu espaço, dando suas vozes e perspectivas únicas para filmes e séries. Basta fazer uma simples comparação com as produções dos 2000, por exemplo, e notar como cresceu drasticamente a quantidade de obras sendo encabeçadas por mulheres, por negros ou pessoas LGBTQIA+.
Esse crescimento por mais diversidade se refere não só a parte de atuação, mas também para direção, roteiro, fotografia, figurino e demais setores de produção. Trazer cada vez mais pessoas de diferentes culturas, ideais e vivências, permite que sejam contadas histórias sob novas perspectivas e com uma sensibilidade que somente uma pessoa que passou por essas experiências consegue trazer.
Lógico, existem exemplos de homens escrevendo ótimas personagens femininas ou brancos escrevendo personagens negros. Basta pegar James Cameron com Sarah Connor e Ellen Ripley ou Brian Michael Bendis e a dupla Phil Lord e Chris Miller com Miles Morales como bons exemplos. Mas é inegável que uma mulher consegue trazer muito mais profundidade e sensibilidade ao escrever uma personagem ou história que aborde a mulher na sociedade, por exemplo, o chamado “lugar de fala”.
Outro fator muito importante e positivo que esse incentivo por mais diversidade trouxe ao meu ver, é o fator de identificação em tela. Seja em um filme de ação e aventura, terror, comédia, drama ou animação, é algo mágico e muito poderoso para o espectador, especialmente para os mais jovens, poder se enxergar em tela e ver que eles também podem ser protagonistas de suas próprias histórias, de que podem conquistar espaços importante e serem excepcionais.
No entanto, o tema de diversidade e inclusão é algo que sempre acaba trazendo reações mistas, normalmente acompanhadas de suspiros frustrados e caretas. “Estão colocando política demais nos filmes”, “Tão forçando inclusão” e “Isso daí é lacração” são algumas que você com certeza já deve ter escutado nas redes sociais.
Este é um tópico extenso e que provavelmente precisaria de um texto próprio para ser devidamente explorado, mas sendo sucinto, arte e política sempre andaram juntas. As obras de arte servem como um reflexo não só da vivência e crenças do artista, como da sociedade e espaço em que ocupa. Arte é um canal para refletir, pensar, denunciar e criticar aspectos da nossa sociedade e política.
Se você pensa que discutir problemas sociais na arte é algo da modernidade, você está bem enganado. Proponho o seguinte exercício: Analise algumas de suas obras favoritas, seja na literatura, na música, teatro e audiovisual. Veja como muitas delas discutem e abordam, hora de forma implícita ou explícita, alguma questão ou problema sócio-político relevante ao período histórico em que essas obras estão inseridas.
Com relação ao sentimento de “inclusão forçada” isso é reflexo de uma situação maior. Arte é uma indústria, e como toda indústria de uma sociedade capitalista, ela sempre visa o lucro e o crescimento, não só em termos financeiros, mas no imaginário coletivo. Perseguir tendências populares, as chamadas “modas” ou “trends” é algo que empresas sempre fizeram para captar cada vez mais a atenção do público e gerar mais relevância e lucro.
Basta ver a quantidade de empresas que seguiram nas recentes trends de fotos de perfil e mascotes versão Disney/Pixar ou o meme “Uma nova emoção” que bombaram nas redes sociais algum tempo atrás, como forma para gerar mais engajamento e passar a ideia de estarem alinhadas com a sociedade. Para os grandes executivos de estúdios, a diversidade é apenas mais um meio para atingir os fins: Ganhar mais dinheiro e relevância.
Sim, existem muitas produções recentes que se escoram unicamente em questões sociais e diversidade para ganharem algum tipo de repercussão e engajamento com o público, sendo criticadas por uma parcela bem grande do público por mais parecerem uma grande palestra do que uma boa história que saiba discutir esses temas sociais.
Mas como existem obras que discutem pautas e problemas sociais que são fracassos de público e crítica e outras que são sucessos absolutos, você me pergunta? Bom, se tivesse que dar uma resposta seria a seguinte: Política, sociedade e arte sempre estiveram intrinsecamente ligadas, como mencionei previamente. O problema não é a diversidade ou a discussão social, e sim a forma como é abordada, seja por causa de um roteiro, diretor e/ou atores fracos.
Barbie, Adoráveis Mulheres, Pantera Negra, Corra!, Midsommar, Heartstopper e A Casa da Coruja são apenas alguns exemplos de ótimas produções recentes que conseguem abordar questões de diversidade ao mesmo tempo em que constroem histórias e personagens cativantes, todos sendo grandes sucessos.
Por mais que os chefões de grandes estúdios e empresas vejam de forma cínica o tópico de diversidade como a nova “moda da vez” e uma maneira de promover uma boa percepção pública e mais lucro, a verdade é que isso possui um impacto profundo.
Arte tem um grande poder transformador em nossas vidas. E poder dar a chance para que mais pessoas possam contar suas histórias, com suas visões, vozes e vivências únicas e conseguir se enxergar em tela, saber que você, do seu jeitinho único de ser, também pode ser o protagonista, o herói ou a heroína de sua própria história e ser capaz de vencer obstáculos imensos, essa é a real magia do cinema e da arte. E quanto mais pessoas puderem vivenciar isso, melhor.