Hellboy: erro honesto ou caça-níqueis padrão?

Antes da sessão de Hellboy começar, o papo na sala girava em torno de CGI (Computer Graphic Imagery, ou imagens de computação gráfica). “…o filme era tão ruim que o gráfico parecia um Play[Station] dois…” foi o comentário de um rapaz na faixa dos 25 anos sobre um filme que não pude identificar.

Para mim, há muitos anos a qualidade dos efeitos especiais não determina a qualidade da produção, mas eu lembro bem de quando tirava sarro do Chapolin Colorado e seus “defeitos especiais”. 

Se por um lado o rapaz e eu temos motivações diferentes para assistir um filme, por outro, ao término da sessão, nossa opinião era a mesma: Hellboy fracassou de novo.

 

O abismo

Hellboy é filho de um demônio com uma feiticeira, vindo diretamente do inferno. Contra todas as probabilidades, tornou-se um super-heroi – é aqui que começam os problemas da produção.

Salvo raras exceções (como o Batman de Christopher Nolan), filmes de super-heroi não se contentam em ajustar sua verossimilhança ao mundo real. É preciso criar um mundo graficamente fantasioso onde poderes, explosões e porradarias mirabolantes preencham o tempo de tela com cenas espetaculosas. E isso (CGI) custa muito caro.

“Vingadores Ultimato” teve um orçamento de aproximadamente 356 milhões de dólares, enquanto “Hellboy e Homem Torto” gastou cerca de 20 milhões de dólares. O resultado? Bem, como diriam os aficionados por efeitos especiais, o filme tem “gráficos de PlayStation 2”.

Teria sido melhor para o filme se o diretor Brian Taylor tivesse admitido para si mesmo que seu filme era mais “heroi” do que “super” – como fez o marketing, de maneira muito competente, ao divulgar que se trata de um filme “indie”. Um filme sem CGI provavelmente agradaria mais do que este com CGI ruim.

Foto: Imagem Filmes

Indie = independent = independente

Conhecidas por seu baixo orçamento, produções “indie” são feitas de maneira independente, sem o aporte financeiro de grandes estúdios (sejam elas produções musicais, publicações literárias, Cinema ou qualquer outra manifestação artística). Mas pouco recurso nunca foi desculpa para trabalho ruim – vai dizer que nunca se divertiu com joguinhos 8-bits de Nintendo ou Game Boy?

“Hellboy e o Homem Torto” tem nas mãos um personagem de grande potencial. Meio humano e meio demônio, feio pra diabo (perdão pelo trocadilho), sem pai nem mãe: alguém que não tem muitos motivos para viver. Toda a sua valentia é, na verdade, escapismo (oi Martin Riggs). Num universo repleto de herois altruístas e de anti-herois mimados, Hellboy e sua vontade de morrer é diamante.

Existem tantas coisas a serem exploradas no personagem que Brian Taylor e seus roteiristas (Christopher Golden e Mike Mignola, criador dos quadrinhos) simplesmente perderam a mão (sabe aquele hotdog com tanta coisa dentro que, quando você morde, a salsicha pula pra fora?)

Não dá para saber se é um problema de roteiro ou de edição, mas o filme é uma clara colcha de retalhos que não sabe de onde saiu e para onde vai. Nada fica muito claro para o público, apesar de todas as explicações dadas. Ao contrário do CGI, roteiro e edição são coisas que não custam os olhos da cara.

Hellboy tem o mesmo problema do Corvo 2024: um vilão fraco, que demora para aparecer e não mete medo em ninguém. A maquiagem, aliás, é tão mal feita que o diretor é obrigado a filmar ângulos estranhos e distorcidos para disfarçar. A assistente do Homem Torto, que deveria ser uma bruxa maquiavélica, não passa de uma cópia barata da Arlequina.


Nem tudo são dores

Hollywood tem lançado bons filmes de terror ultimamente. Parece que a época da groselhada slasher finalmente passou, dando lugar aos medos psicológicos, sobrenaturais, coisas que assustam de verdade. Hellboy acerta demais quando se junta a esse movimento. A atmosfera fria e pesada do filme tem tudo a ver com a mente do personagem.

O trabalho de fotografia e pós-produção também agrada: aliada a ótimas locações nas florestas da Bulgária, a paleta de cores escolhida é simplesmente perfeita. Mas é só isso. Hellboy é tipo o Nintendo 64: anunciado com muita pompa, uma ou outra coisa boa mas essencialmente problemático. Cinematograficamente, trata-se de um fracasso retumbante. Resta saber se o dinheiro arrecadado será suficiente para agradar seus investidores.

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