A partir das páginas dos folhetins, transitando para o rádio e, posteriormente, consolidando-se na televisão, onde alcançou grande sucesso, a novela tem evoluído ao longo das décadas, adaptando-se às novas tecnologias sem perder sua identidade. Esse cenário não é diferente com as plataformas de streaming. “Guerreiros do Sol”, “Beleza Fatal” e “Pedaço de Mim” são produções inéditas em fase de desenvolvimento, prestes a serem disponibilizadas nos serviços sob demanda. A primeira pertence ao catálogo do Globoplay, que já lançou “Verdades Secretas 2” e o aclamado “Todas as Flores”. A segunda marca a incursão da HBO Max no gênero, enquanto a terceira representa a estreia da Netflix na produção de novelas brasileiras, contando com Juliana Paes e Vladimir Brichta como protagonistas.
A informação de que HBO Max e Netflix também adentraram nesse segmento agitou o cenário do entretenimento. A HBO Max, em particular, garantiu a participação de renomados profissionais da teledramaturgia nacional, incluindo Silvio de Abreu, figura que construiu sua carreira por muitos anos na Globo e recentemente fez a transição para a HBO. Além disso, a plataforma trouxe Monica Albuquerque, que possui uma trajetória destacada na emissora da família Marinho e atualmente ocupa a posição de líder na gestão de talentos e desenvolvimento de conteúdo scripted Latam na Warner Bros. Discovery (WBD), conglomerado que engloba a HBO Max.
A Warner Bros. Discovery (WBD) ressaltou que tem como foco principal no Brasil as novelas e séries de true crime. Em 2021, a empresa apresentou Raphael Montes, renomado roteirista e autor de obras como “Bom Dia, Verônica” e “A Menina que Matou os Pais/O Menino que Matou Meus Pais”, como o responsável pela sua primeira novela.
Beleza Fatal já conta com mais de 40 capítulos escritos, conta com a confirmação de Camila Pitanga e Murilo Rosa e terá gravações em São Paulo e no Rio. Além disso, a WBD anunciou oficialmente o remake de “Dona Beija”, originalmente exibida pela Rede Manchete em 1986.
Diferenças
Entretanto, é válido questionar se as obras produzidas exclusivamente para plataformas de streaming devem apresentar um formato e público distintos. Reynaldo Maximiano, pesquisador de teledramaturgia e professor nos cursos de jornalismo e publicidade da Uemg Divinópolis, sugere que é necessário realizar algumas adaptações. Isso se deve ao fato de que o modelo tradicional de novela, conforme conhecido pelos brasileiros, foi concebido muito antes do advento da TV a cabo e da internet.
“Ele foi pensado para estar no cotidiano das pessoas e está muito ajustado a um padrão de comportamento da audiência. As pessoas tinham determinada rotina, tínhamos poucas emissoras, poucas opções de entretenimento. E esse modelo criou outra coisa, o da obra aberta, que é uma característica que acho que não será parâmetro para uma novela pensada e produzida para o streaming. Eu acredito que esse formato que será explorado pelo streaming precisa ser alterado, pensado de outra maneira, até porque a audiência no streaming é bem diferente da audiência na TV tradicional”, opina.
Por outro lado, Teresa Penna, representante do Globoplay, argumenta que a novela, independentemente da plataforma, compartilha características fundamentais com os tradicionais folhetins. Contudo, destaca que o streaming oferece uma dinâmica distinta e maior liberdade na abordagem de determinadas temáticas. Segundo ela, as tramas tendem a ser mais concisas, com menos núcleos e uma narrativa mais ágil. Em relação ao público final, Penna enfatiza que o público brasileiro é entusiasta do gênero, sem levar em conta a plataforma de exibição.
“Seja na TV aberta, na TV por assinatura ou no streaming, não há uma competição entre as janelas. Basta notar como as novelas se destacam em todas elas. Na TV Globo, são campeãs de audiência; no Globoplay, estão entre os títulos mais assistidos na plataforma; e o Viva é o canal mais assistido da TV por assinatura. Uma obra em exibição linear na TV potencializa o consumo do título também no Globoplay. E uma produção que teve um excelente desempenho de consumo no Globoplay tende a performar muito bem no linear. É um processo de retroalimentação”, justifica.
Monica Albuquerque, da WBD, também destaca sua opinião e diferencia os formatos. “Nos canais lineares, a novela que passa todo dia tem um ritmo diferente; uma grande característica é a repetição. Cada capítulo retoma o que aconteceu no dia anterior, há repetições, porque nem todos assistem todos os dias, necessariamente. Esse ritmo é muito específico das novelas, mas, quando elas passam para o streaming, não é mais necessária essa repetição – já que cada espectador escolhe que episódios assistir, em que momento parar, se vai rever o anterior. O que estamos fazendo é imprimir o ritmo de série à estrutura do roteiro melodramático. Nós estamos vendo muito a inspiração do melodrama em séries, como ‘Euphoria’ ou ‘Succession’, mas a ideia aqui é combinar os elementos das novelas ao compasso mais dinâmico das séries de TV”, explica. A Netflix foi procurada para falar sobre o seu investimento no gênero, mas quis se pronunciar.
O Prime Video, plataforma de streaming da Amazon, também optou por investir nessa área e, em colaboração com o SBT, adicionou ao catálogo a novela inédita “A Infância de Romeu e Julieta”, escrita por Iris Abravanel. A parceria resultou em uma exibição de segunda a sexta, às 20h45, na TV aberta. As informações divulgadas pela assessoria de imprensa da emissora de Silvio Santos indicam que essa colaboração, envolvendo licenciamento e coprodução, será de longa duração. Isso implica que as obras do SBT terão presença no streaming e que projetos futuros serão desenvolvidos em conjunto pelas duas empresas.